Com ruídos, iluminação e estímulos sensoriais, os ambientes corporativos tradicionais variados são desafiadores para esses profissionais
Pessoas neurodivergentes com TDAH (Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade), TOC (Transtorno Obsessivo-Compulsivo), AH/SD (Alta Habilidade/Superdotação) e TEA (Transtorno do Espectro Autista) costumam enfrentar desafios que são geralmente encarados como barreiras para que elas alcancem uma melhor produtividade no ambiente de trabalho. Para começar, é fato que muitas delas chegam nas empresas sem nem mesmo saberem que possuem essas diferenças. Mas o desempenho acima da média demonstrado por muitos representantes desses profissionais com a disseminação do home office começa não só a auxiliar no aumento do diagnóstico dos casos, como também no entendimento sobre como as empresas devem agir para acolher essas pessoas da forma adequada em seus quadros e ajudá-las a desenvolver todo o seu potencial.
Anderson Belem, CEO da Otimiza, worktech especializada em benefícios corporativos adaptados às necessidades do trabalho híbrido, explica que ao trabalharem em suas casas, as pessoas com neurodivergência têm a possibilidade de adaptar o ambiente para eliminar distrações como uma janela voltada para a rua ou conversas próximas, que são desafios comuns para TDAHs, por exemplo, uma síndrome que capta múltiplos estímulos simultaneamente e que, por isso pode ser exaustivo e angustiante. “Ambientes corporativos tradicionais, com seus ruídos, iluminação e estímulos sensoriais variados, podem ser particularmente desafiadores para essas pessoas”, diz.
Ele chama a atenção para a dificuldade de identificar as pessoas que precisam deste tipo de cuidado no ambiente de trabalho. O executivo afirma que não há dados precisos sobre o número de pessoas com altas habilidades/superdotação, por exemplo, que chegam ao mercado de trabalho sem diagnóstico. No entanto, algumas estatísticas fornecem uma perspectiva como o Censo Escolar 2022, que registrou 26.815 alunos com AH/SD na educação básica, ou a Mensa, a maior, mais antiga e mais famosa organização de alto QI do mundo, que estima que 2% da população mundial tem alto QI, sugerindo cerca de quatro milhões de brasileiros superinteligentes.
Já as estimativas da OCDE indicam que entre 1% e 3% dos estudantes podem ser considerados superdotados, o que no Brasil representaria entre 470 mil e 4,7 milhões de estudantes. “Estes números mostram uma discrepância significativa entre o número de indivíduos potencialmente superdotados e os formalmente identificados nas escolas, sugerindo que muitos podem chegar ao mercado de trabalho sem terem sido diagnosticados”, ressalta.
Engajamento é a chave
A busca pelo diagnóstico e adequação de indivíduos neurodivergentes no ambiente de trabalho é uma preocupação que deve crescer a cada dia nas organizações. “Quer seja pela vertical social do ESG, de inserir essas pessoas no mercado de trabalho, quer seja pelo caráter da governança, vinculado ao desejo de obter o melhor resultado deste capital humano, o fato é que as empresas não podem mais se darem ao luxo de trabalhar com achismos e velhos preconceitos como este assunto. Se a sociedade quer tornar os ambientes de trabalho cada vez mais agradáveis e eficientes, é necessário aumentar significativamente a atenção aos neurodivergentes”, afirma Roberto Gonzalez, consultor de governança corporativa e ESG.
Por sua vez, Valmir de Souza, COO da Biomob, startup especializada em soluções de acessibilidade e consultoria para projetos sociais, afirma que o primeiro passo para auxiliar o pleno desenvolvimento de profissionais com essas características é tentar eliminar os vieses inconscientes, já que a pessoa neurodiversa, assim como a diversidade funcional, pode ter um grau leve, moderado ou alto.
“Compreender o nível desse indivíduo é fundamental para determinar quais expectativas poderão ser cumpridas no ambiente laboral. Não adianta querer que uma pessoa com TEA seja um grande comunicador ou um relações públicas, porém essa mesma pessoa pode ser um excelente programador ou outra atividade que requeira hiper foco”, explica.
O segundo passo, segundo ele, é realizar a capacitação desse colaborador. “Muitos não têm nenhuma chance no mercado de trabalho e isso os coloca em condição de desigualdade. É necessário acreditar no potencial humano. Uma pessoa diversa pode apresentar resultados extraordinários, ela só precisa de uma oportunidade”, diz.