Sobrevivente de acidente aéreo que matou dois paraquedistas em Boituva teve que largar a carreira por conta das sequelas: ‘Perdi tudo’

Ex-instrutor de saltos conta a luta para se recuperar de grave lesão nos nervos do plexo braquial, três anos depois do acidente com avião de paraquedistas em Boituva (SP). Duas pessoas morreram na ocasião.

Três anos depois, o ex-instrutor de saltos Lucas Gemenes Marques ainda luta para se recuperar das lesões que sofreu no acidente com o avião de paraquedistas, em maio de 2022, em Boituva (SP). O acidente provocou as mortes de duas pessoas, além de ferimentos em outras nove – sendo cinco delas com lesões graves.

“No acidente, eu perdi minha profissão. Não consegui mais atuar nela”, declarou Marques, em entrevista à TV TEM.

No acidente, em 11 de maio de 2022, o avião Cessna 208 Caravan com 15 paraquedistas, além do piloto, teve pane no motor e fez um pouso de emergência em um pasto na área rural. A aeronave bateu em um barranco e capotou.

Lesão nos nervos do plexo

Quatro meses depois do acidente, o ex-instrutor passou por cirurgia no plexo braquial, uma rede complexa de nervos que se origina na região do pescoço e se estende pelo ombro até os braços e as mãos.

Conforme descreve no perfil em uma rede social, a lesão ocorreu nas raízes da cervical C5-C6, o que afetou o tronco superior do plexo braquial.

Ex-instrutor de paraquedismo Lucas Gemenes Marques, durante exercício de reabilitação: ele sofreu lesão nos nervos do plexo braquial, no acidente com avião em 2022, que provocou a morte de duas pessoas em Boituva — Foto: Reprodução/Rede social

Ex-instrutor de paraquedismo Lucas Gemenes Marques, durante exercício de reabilitação: ele sofreu lesão nos nervos do plexo braquial, no acidente com avião em 2022, que provocou a morte de duas pessoas em Boituva — Foto: Reprodução/Rede social

Marques narra a trajetória de sua reabilitação e a tentativa de recuperar os movimentos do braço, comemorando a execução de gestos simples (dobrar o cotovelo, por exemplo) como enormes conquistas. Além de fisioterapia, ele se apoiou na prática de ioga para buscar a reabilitação.

Em agosto de 2023, ele chegou a postar uma esperança. “Ainda é incerto se vou conseguir voltar à minha profissão que também era meu hobby e meu sonho. Mas a fé e a dedicação estão em alta. Sempre. Até nos momentos mais escuros”, publicou.

Mas o retorno não aconteceu, como declarou em entrevista para a TV TEM. “Perdi minha carreira toda, perdi tudo, não conseguia mexer o braço. Ainda por cima não tinha dinheiro. Fiquei sem salário. Enfim, minha vida mudou completamente”, afirmou Marques.

O ex-instrutor de saltos conta que a empresa Sky Dive For Fun, que era dona do avião, pagou por um ano pelo tratamento dele e depois cessou. Ele ingressou na Justiça com ação para garantir a continuidade do pagamento.

“Quem podia me ajudar, me virou as costas, bateu as mãos e foi embora. Foi bem difícil para mim essa época”, declara, revelando que caiu em depressão.

“Como me dediquei muito a esse esporte, para chegar no lugar mais alto, acabei perdendo meu meio social com o acidente. Perdi minha convivência com meus amigos”, lamenta.

Anexado ao inquérito

Na terça-feira (5), a Polícia Civil de Boituva anexou o relatório elaborado pelo Cenipa ao inquérito que apura as circunstâncias do acidente e o enviou para análise do Ministério Público, mas pedindo a prorrogação do prazo para que as investigações sejam concluídas.

O MP concordou com a prorrogação do prazo e aguarda a conclusão.

Em nota, a Secretaria de Segurança Pública (SSP-SP) informou que a Polícia Civil cumpriu “todas as diligências necessárias seguindo a legislação”, incluindo a coleta dos depoimentos de envolvidos e testemunhas, além da análise de laudos periciais, entre outras medidas.

“Todas as perícias foram realizadas à época e contribuíram para a conclusão da investigação. O caso retornou para o cumprimento de cota para a inclusão do relatório do Centro de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos (Cenipa), que foi cumprido e enviado, sendo remetido novamente ao Ministério Público”, informa a SSP, na nota.

Avião caiu na cidade de Boituva, no interior de SP — Foto: Polícia Militar/Divulgação

Avião caiu na cidade de Boituva, no interior de SP — Foto: Polícia Militar/Divulgação

Uso inadequado

No relatório, finalizado nesta semana, e ao qual a reportagem da TV TEM teve acesso, o Cenipa relaciona a pane do motor do avião ao uso incorreto da alavanca que controla o combustível e a potência da aeronave, chamada de EPL.

No documento, o órgão aponta ainda que a falta de manutenção nos cintos de segurança contribuiu para as lesões nos passageiros. Um deles chegou a ser arremessado para fora após o avião fazer um pouso forçado e capotar no pasto.

Para subsidiar o relatório, os peritos do Cenipa chegaram a utilizar as imagens das câmeras dos capacetes dos paraquedistas, que registraram toda a sequência do acidente.

TV TEM obteve acesso às imagens com exclusividade. Elas revelam momentos de tensão e desespero.

A aeronave havia decolado do Centro Nacional de Paraquedismo (CNP), em Boituva, na manhã de 11 de maio daquele ano. Durante o voo, o motor apresentou problemas, perdendo potência e altitude.

A câmera de um paraquedista chegou a flagrar o momento em que chamas saem pelo escapamento do motor.

Para elaborar o relatório, técnicos do Cenipa utilizaram também imagens das câmeras dos capacetes dos paraquedistas, durante o acidente, que vitimou duas pessoas, em 11 de maio de 2022, em Boituva (SP) — Foto: Reprodução/TV TEM

Para elaborar o relatório, técnicos do Cenipa utilizaram também imagens das câmeras dos capacetes dos paraquedistas, durante o acidente, que vitimou duas pessoas, em 11 de maio de 2022, em Boituva (SP) — Foto: Reprodução/TV TEM

Vítimas

Na queda da aeronave, dois paraquedistas morreram: André Luiz Warwar, de 53 anos, e Wilson José Romão Júnior, de 38. Outras cinco pessoas ficaram com lesões graves, quatro tiveram ferimentos leves e cinco não se machucaram.

Com base no relatório do Cenipa, o perito Robeto Peterka, especialista em segurança área, afirmou à TV TEM que a pane no motor pode ter sido causada pelo uso deficiente do dispositivo que controla a quantidade de combustível no motor, resultando em uma potência excessiva.

O Cenipa verificou que o dispositivo EPL ainda era utilizado frequentemente em treinamentos pela empresa proprietária da aerovane, em desacordo com a orientação do fabricante, que prevê a utilização apenas em situações de emergência.

Vítimas foram identificados como André Luiz Warwar, de 53 anos, e Wilson José Romão Júnior, de 38, em Boituva (SP) — Foto: Arquivo pessoal

Vítimas foram identificados como André Luiz Warwar, de 53 anos, e Wilson José Romão Júnior, de 38, em Boituva (SP) — Foto: Arquivo pessoal

FONTE: G1

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